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MODA – VERDADES E MITOS POR RENATA ZAGANIN

Quando fiz moda, há muitos e muitos anos atrás, existiam pouquíssimas faculdades com tal curso no curriculum e como tinha a veia mais artística, me decidi pela Santa Marcelina, já que é focada em criação. Mas, nessa época, estudar moda era visto como algo “estranho” e pouco se falava sobre esse mercado. O que as pessoas não sabiam é que a Faculdade de moda viria a ser uma das mais procuradas pelas novas gerações… Mas, qual é a realidade de tal mercado em nosso país? O que realmente um curso de moda pode lhe acrescentar para que consiga ingressar nesse universo tão almejado, considerando que a Indústria da Moda no Brasil é hoje a quinta maior do país? E, qual é o portfolio de um curso nesse segmento? Para esclarecer essas e outras questões, conversei com a Estilista Renata Zaganin, professora de Desenho & Ilustração de Moda na Graduação há 19 anos na Faculdade Santa Marcelina (FASM), e responsável pela Pós-graduação em Moda & Criação na FASM também, onde remodelou todo o escopo do curso existente até 2013. É ela quem nos diz, em entrevista ao Buyer & Brand, quais as verdades sobre esse Universo tão cobiçado.

RENATA ZAGANIN
RENATA ZAGANIN

 

O Brasil forma verdadeiros criadores, estilistas?

Sim! Alguns cursos de Moda nacionais são hoje, tão especializados e integrados em suas matérias, que não deixam nada a dever aos maiores centros acadêmicos internacionais. A questão é bem delicada. Ensinar CRIAÇÃO a alunos, vindos de formações diversificadas e muitas vezes com um repertório cultural muito raso, é bem complicado. Mesmo aqueles alunos formados em grandes instituições, chegam à Graduação, com lacunas importantes quanto a conhecimentos gerais, história geral, história da arte, etc… As vivências também são diferentes para o adolescente de hoje. Por mais que a informação esteja mais acessível, os interesses desses jovens nem sempre ajudam na formação de um repertório rico. Digo isso, porque introduzir um jovem no universo da criação é uma tarefa complexa, que exige muito desse indivíduo que busca se diferenciar no mercado. Hoje, é muito mais simples “copiar”. Algumas pessoas e muitas empresas, nem imaginam como para o mercado atual, a criação, a inovação e o personalizado, são importantes. O futuro de nossas empresas depende sim, desses alunos mais criativos! Outro dado importante, é que poucas graduações, oferecem uma formação sólida nesse quesito. Por ser difícil ensinar dessa forma e porque muitas pessoas e parte do mercado acham equivocadamente que criação, tem a ver com roupas que não conseguimos usar, ou algo fantasioso.  O que fazemos na realidade é abrir uma pequena caixa, de difícil acesso, mas, que, uma vez aberta, possibilita a esse profissional, CRIAR com qualidade para qualquer segmento. O importante é o produto AUTORAL!

Por que a Moda fascina tanto?

Por que é uma das formas de comunicação mais diretas e essenciais que conhecemos. É um tipo de linguagem que mesmo os não “inseridos”, acabam usando. De certa forma, o designer tem um poder mágico de criar (ou destruir!) uma imagem. Quantas vezes ouvi de amigos próximos, depoimentos de medo pela convivência com uma “estilista”: “você deve estar enxergando todos os meus defeitos! ” Sabemos que no fundo, lidamos diariamente com códigos secretos que nos apresentam ao mundo, através de nossa imagem pessoal. Quem não gostaria de conhecer esses códigos?

O que uma faculdade de moda oferece? Quanto ao portfólio, quais as bases que um curso de moda proporciona ao aluno?

As graduações com uma boa carga horária moldam ótimos alunos técnica e culturalmente.  O mais importante, é esse aluno ter a disponibilidade para se aprofundar com responsabilidade, no seguimento onde pretende atuar. A vida de um designer de moda é uma constante atualização. Alguns alunos, de forma ingênua, acham que a instituição de ensino é 100% responsável por sua formação e isso é um grande engano. A formação superior de um indivíduo está totalmente ligada à sua disponibilidade para VIVER o processo. Alguns alunos entram e saem do curso, dentro de uma redoma que impossibilita qualquer absorção real de conteúdo. Estamos falamos de matérias que exigem crescimento e amadurecimento pessoal. Nesse contexto, o apoio e a ajuda da família, mais os alicerces dados por essa, são agentes atuantes importantíssimos.   Os conteúdos diversos – modelagem, desenho, têxtil, estamparia, joalheria, acessórios, metodologia visual, estilo, planejamento de coleções, marketing, história da arte e da moda, fotografia e tantas outras matérias, são oferecidas como fundamentação básica. A “alma” desses conteúdos vem com o envolvimento responsável desses jovens.

Para quem quer trabalhar com moda e fez outra faculdade, basta fazer cursos livres ou é necessário uma pós-graduação ou mestrado?

O mestrado se destina àqueles profissionais que já se sentem atraídos para uma carreira acadêmica. Quanto às especializações, lato sensu, essas são muito importantes para nortear os profissionais de áreas correlatas. Também são importantes instrumentos de atualização e especialização em um determinado campo. Eu diria que com a complexidade de nossa área, o correto seria uma pós e algumas extensões ou cursos livres. Cada vez mais, percebo que não temos mais o tempo necessário para “aprender” dentro de uma empresa. Quando comecei a trabalhar com moda, final de 80/início de 90, as empresas reconheciam a falta de formação em função de um mercado iniciante. Hoje, as empresas mais normatizadas já esperam um profissional mais qualificado, como acontece em todas as outras áreas.

É obvio que aprendemos a fazer e a ser um profissional completo, quando vivenciamos o mercado. Essa é a melhor especialização para os alunos e por isso, o estágio se torna tão fundamental!

Mas, acho que daqui para frente, somos cada vez mais responsáveis, por essa geração de profissionais. As instituições devem respeitar seus alunos quanto a esse compromisso de qualidade e os alunos devem estar cada vez mais atentos, para cobrar formações dignas. Moda virou moda! Hoje, qualquer um acha que pode contribuir como docente. Vejo professores que nem vivenciaram o mercado, falando sobre teoria sem nem imaginar a prática efetiva.

As instituições com um corpo docente sólido, coeso e engajado  são as escolhas certeiras. Uma ótima estrutura sozinha, não forma profissionais e seres humanos de competência emocional para o mercado. Um corpo docente comprometido, sim!

 

Uma pessoa que se forma em moda, pode trabalhar em quais segmentos?

Esse leque fica cada vez mais abrangente! Temos alunos trabalhando em todos os segmentos de moda. Muitas vezes, surgem caminhos inusitados e muitas vezes, muito rentáveis.  De assistentes de estilo à diretores de criação; de fotógrafos de moda à ilustradores de grandes magazines internacionais. Temos alunos que se especializam em joalheria e tornam-se grandes nomes do design de joias. Alunos em grandes museus de Londres, fazendo a curadoria. Realmente, a vantagem de uma boa formação é exatamente a falta de limites quanto à atuação.

É preciso saber desenhar para fazer moda?

É preciso ter uma percepção muito treinada. Não vou dizer que o aluno precisa ser um grande desenhista, mas, precisa conhecer muito bem a volumetria corporal para se destacar como um grande criador. E esse processo, passa pelo desenho. No desenho, trabalhamos diversas questões que esse aluno usará para o resto da vida e muitas vezes, o aluno nem tem ideia disso. Prospectar uma ideia através de croqui, verificar sua aplicabilidade pelo desenho de moda proporcional, documentar projectualmente pelo desenho técnico e divulgar pelas ilustrações e desenhos promocionais, é o sistema mais eficaz de assegurar um bom produto.

 

Quais são as maiores dificuldades encontradas para ingressar no mercado de moda no Brasil?

Por incrível que pareça, a maior dificuldade é a de se transformar com pouca idade, nesse “super profissional” multifacetado que o mercado deseja. Formação técnica, línguas, vivências, especializações, cursos específicos, bagagem internacional. As questões pessoais também comprometem muita gente: responsabilidade, pontualidade, profissionalismo, equilíbrio. E o problema não é a penas o ingresso. Vivemos em um grande sistema que provoca e afeta o discernimento de muita gente. A falta de humildada somada a pouco conteúdo e trabalho, é o que geralmente compromete muita gente. Por isso a grande importância de um docente tutor, que prepare e humanize cada vez mais esse profissional.

Qual seu conselho para quem quer cursar moda e para quem está ingressando nesse mercado de trabalho?

Que saiba muito bem o que quer. Uma escolha desse tipo exige consciência, exatamente por ser um grande investimento financeiro e emocional. Só a técnica, não me transformará em estilista. Você reconstruirá uma alma. É como alguém que deseja ser médico, mas, não pode ver sangue.

Sempre brinco com meus alunos, que não temos final de semana nem férias de “sermos designers”: o mundo todo é nosso campo de referências. Estamos 24 horas por dia, ligados e criando.

RENATA ZAGANIN –  zaganin@terra.com.br  e @rzaganin

 

 

Marcia Paron
Marcia Paron
Marcia Paron é estilista e Fashion Buyer, trabalhou para importantes marcas internacionais como Miss Sixty e Zara e hoje é gerente de negócios da cadeia Espanhola de lojas El Corte Inglés. Apaixonada por estética, arte e moda desde sempre, decidiu colocar em prática a paixão por escrever e orientar pessoas sobre tendências de moda, estilo pessoal, consumo consciente e autoestima, através do blog Buyer & Brand, um espaço aberto à informação sem afetação, com foco em moda acessível, feita para mulheres reais.
http://buyerandbrand.com.br

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